sexta-feira, 18 de abril de 2014

Hora de voltar


Sentadas bem no meio de uma ladeira, na mais bela cidade de interior, quatro garotas compartilham uma garrafa de vinho, que era dos mais vagabundos. Ainda bem, porque qualquer traço de luxo roubaria a beleza da cena. Elas estavam livres de qualquer preocupação, regra ou restrição. Poderiam permanecer ali com a maior das garantias de segurança. Se carro em cidade pequena é coisa pouca, que dirá no meio da madrugada. O motorista que aparecesse, como de costume em qualquer vilarejo, encontraria um jeito de desviar calmamente para não atrapalhar o sossego de ninguém. Já que era virada de sábado para domingo, também passeavam longe os pensamentos no excesso de trabalho, na prova difícil da faculdade ou no namorado distante. Ah o poder do álcool! Higienizador de mesas e mentes.  

Da janela de uma casa velha, com as beiradas pintadas de azul royal, a menina observava aquilo tudo com inveja contida e encantamento. Nunca havia experimentado aquela sensação. A cabeça levemente conservadora não permitiria, mas tinha uma noção precisa de como tudo aquilo poderia ser bom. Liberdade descompromissada que a menina não sentia há anos e, agora, voltava a aparecer. Essa mesma tranquilidade de escrever de novo com todo o afeto que o português merece sem as amarguras das frases feitas. Distante daquelas construções forçadas ao alinhamento da lógica de sempre. Com carta branca para as repetições intencionais e respeito aos erros que, é claro, podem surgir em qualquer lugar. Assim, depois de mais de doze meses os dedos deixam de bater no teclado, apenas caminham. Já era hora de voltar!