sábado, 25 de junho de 2011

É preciso um bocado de tristeza


Era um daqueles dias pós-feriado que todo mundo trata como se fosse feriado mesmo. Ruas vazias, passos lentos pelas ruas e comerciantes batendo papo nas portas das lojas por falta de clientes. A menina saiu logo depois do almoço para um passeio. Vestiu roupas leves de ginástica e ignorou o frio que estava sentindo dentro de casa e por dentro também. Logo encontraria algo para aquecê-la. Pelo menos externamente. O sol de inverno estava forte e o céu com aquele azul clarinho que ela adora. Só dava pra sentir frio com aquele ventinho que misteriosamente a gente só sente quando está à sobra. A demora para a chegada do ônibus não virou um incomodo. A menina ansiosa havia aprendido que para certas coisas o jeito é esperar. Chegando ao local, o passeio não se tornou agradável como o esperado. Ela escutou coisas que chegou a imaginar, por várias vezes, serem verdade. De certa forma já eram esperadas. Mas como aquilo tudo era ruim demais ela acabou ouvindo cada palavra com ares de novidade. Como algo “não acreditável’. E a garota ficou sem chão. Indo embora atravessando a rua em direção ao lado errado.

A tristeza tomou conta pelo caminho e pela vida. E nessas horas quem nunca aproveitou pra se lembrar de todas as vezes que sentiu aquele gosto amargo e familiar? O difícil é recordar das coisas boas que vieram depois de uma perda. E ela bem sabe que pra gente agarrar alguma coisa na vida tem que abrir a mão e inevitavelmente surge o espaço necessário pra outra coisa escapulir e ir ao chão. A menina ficou incomodada com o cara que olhava de um jeito discreto e espantado para as lágrimas que não eram contidas pela parte de baixo dos óculos escuros dela. Que tipo de situação ele estaria imaginando ter acontecido pra justificar um rosto tão triste? Talvez um ferimento, a perda de algo importante ou uma morte. Ou então todas as alternativas anteriores. Ah que idéia maravilhosa usar óculos escuros. Uma vez disseram para a menina que eles davam a sensação de invisibilidade, como acontece com algumas crianças de menos de 5 anos de idade que juram que basta fechar os olhos para não serem vistas por ninguém. A garota se sentia dessa maneira, então ignorou a presença de quem estava no coletivo e se deu ao luxo de sofrer como se estivesse sozinha trancada no quarto de luz apagada. Chegada à hora de descer do ônibus pegou seu caminho na rua e na vida. A tristeza seguiu de guarda costas por um tempo, mas logo logo ela vai embora. Isso porque nem relógio trabalha de graça. E da menina a tristeza não vai receber nem mais um prato de comida e mais um centavo. Pelo menos não por aquele motivo. Pelo menos não por agora. 

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Garçom aquí nessa mesa de bar


Uma amiga chamou pra sair. A menina de cara quis inventar uma dor de dente, falta de dinheiro ou qualquer uma das estratégias que sempre usou para não sair de casa. Algo extremamente perigoso, pois, muitas vezes implica em conhecer gente nova e estar em um ambiente que não seja nem a própria casa nem o trabalho. Seguindo orientações da terapeuta, resolveu não utilizar o poderoso artifício de criar desculpas e aceitou o convite. Em 3 horas chegaria o momento planejado para sair de casa. Logo começaram as dores de estômago. Ela sabia que tudo aquilo era psicológico então começou a se planejar para tirar o foco da dor. Escolheu o vestido, mudou de idéia umas 10 vezes antes de vestir e mais duas quando já estava com ele no corpo. O ritual com os sapatos foi mais ou menos o mesmo, só que mais rápido. Ela não é dessas mulheres sortudas que tem mais de 12 sapatos à disposição. Arrumou o cabelo, escolheu o perfume e, de repente, se deu conta de que estava se arrumando demais. É que sutilmente foi entrando na cabeça dela a possibilidade de chegar lá no barzinho e conhecer um cara especial. (Sim, apesar de tentar se proteger de tudo e de todos, a menina sempre achava que poderia existir um cara como ela sonhava.) E a dor de estômago virou frio na barriga.

Na hora de sair, foi só entrar no ônibus para começar a chover. A menina tratou de interpretar a água vinda das nuvens como um aviso vindo dos céus de que era melhor ficar em casa. Já não dava pra desistir mais, então seguiu rumo ao destino traçado. Acomodada na mesa junto às amigas, olhava distraidamente para as pessoas no bar e ao mesmo tempo desviando o olhar com medo de que ele se cruzasse com o de alguém. Poderia achar ali um cara bacana. Mas lembrando das experiências anteriores era bem provável que as esperanças a levassem em direção ao babaca que só quer tirar onda com os amigos ou ao típico homem “bonzinho”, que costuma ser um excelente ator. O tempo passa e um cara que ela nem tinha percebido se aproxima da mesa e começa a conversar. Ela pensa de imediato em como fazer com que ele vá embora. Fez isso a vida inteira então tem experiência no assunto. Mas logo desiste por um motivo que nem faz idéia de qual seja. As respostas inicialmente monossilábicas viram frases de três palavras e depois ganham sorrisos de acompanhamento. Ele é legal. Pode ser que se torne um chato mais pra frente ou se torne ainda mais encantador. Como ainda não dá pra saber, o jeito é esperar, observar e não ficar presa às lembranças do filho da P@#$%* que ela conheceu meses atrás. Dizem que quem procura acha. Ela decidiu testar essa teoria. 

terça-feira, 21 de junho de 2011

Das cores das flores


Uma flor caída no chão. Meio murcha, parecendo talvez que acabou de ser arrancada da árvore por uma criança que logo se cansou da brincadeira e deixou ali perto do meio fio. Tinha um monte de pétalas, embora algumas tivessem sido já arrancadas. Se alguém brincou de “Bem me quer, mal me quer” com ela, se cansou logo de início. Ou porque passou a não acreditar nessas coisas, de repente, ou porque percebeu que tirar pétala por pétala seria uma forma meio demorada para descobrir se era amada por alguém. Tudo bem que tem gente que passa a vida inteira atrás dessa resposta (o que é muito mais tempo), mas ai é outra história. A tal flor foi apanhada do chão por uma menina que passava distraída pela rua, mas não o suficiente para deixar aquele objeto vermelho tão vivo ficar ali despercebido. A garota se lembrou de quando viu, pela primeira vez, um bouquet de flores entrar em casa. Por coincidência eram da mesma cor da que ela tinha agora nas mãos. Foi um presente que a irmã havia ganhado do namorado. Naquela época, as crianças da escola brincavam de classificar os sentimentos das pessoas de acordo com as cores das flores que davam de presente. As brancas serviam para entregar ás mães, avós ou alguma tia querida. As rosas rosas normalmente eram para amores delicados como namoros de pouco tempo ou para alguma pretendente. E vermelhas só mesmo em caso de paixão misturada com amor. 

A menina ficou pensando se aquela flor teria sido dada de presente a alguém e jogada fora depois da descoberta de uma traição. Ou largada após um pedido de desculpas não aceito. Será que ela fazia parte de um conjunto com outras flores, envolvidas por um papel bonito e um laço de fita bem grande? Ou seria dessas solitárias que saíram de alguma floricultura daquele jeito e, assim como algumas pessoas na vida, parecem ter nascido com o destino de não ter acompanhamento? Resolveu guardar a flor dentro de um bloquinho de anotações guardado dentro da bolsa. Não queria dar ao objeto o caminho da lixeira mais próxima. Cada pétala ficaria guardada quase que para sempre. O perfume mudaria e não haveria mais o tom fresco de uma flor recém colhida. Mas a essência estaria ali armazenada. Mesmo a garota não tendo o menor conhecimento da real história da flor morta que permanecia viva de alguma forma.  

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Sem energia


Ela precisou fazer hora extra no trabalho, mas o que irritou não foi sair mais tarde. O negócio era o motivo: falta de energia elétrica. Sem computador e sem telefone por 3 horas, as tarefas se acumularam e infelizmente não dava pra deixar pro dia seguinte. Na saída, a chuva que tinha dado uma aliviada ficou mais forte e levou embora a chapinha feita no dia anterior. O guarda-chuva foi moldado pelo vento e primeiro ganhou forma de taça para depois se tornar apenas um guarda chuva quebrado. Os papéis, que a menina levava pra casa com a intenção de continuar o velho ritual de adiantar as tarefas no ambiente familiar, de tão molhados começaram a se desmanchar. Finalmente o ônibus chegou e a chuva parou. No trajeto, ou o trânsito ficava completamente parado ou o veículo acelerava em meio a ruas quase completamente escuras. Quando aparecia uma luzinha ela só servia pra revelar postes caídos, árvores em cima de carros e objetos carregados pelo vento. Chegou a hora de descer do ônibus. Luz a menina só viu do farol dos carros. Com tudo escuro, os três quarteirões percorridos todos os dias até o seu lar nunca se tornaram tão grandes. 

O chaveiro nas mãos com a chave já preparada para se unir à fechadura, os passos apressados e o tremor provocado pelo frio misturado com medo acompanharam a moça no caminho. Em casa, pensou em ligar o computador, assistir um pouco de TV, ouvir uma musiquinha e antes de tudo isso tomar um belo banho bem quente. Acabou frustrada indo procurar uma vela. De repente, a menina escuta um barulhinho chato e se dá conta de que a bateria do celular tinha acabado. Em um gesto automático, colocou o carregador na tomada e logo depois começou a rir de si mesma. Pelo menos o bom humor não tinha ido embora junto com a energia. O jeito era tentar usar o telefone fixo para xingar as atendentes da CEMIG. Como ele também não estava funcionando o negócio foi passar a noite sem brigar com ninguém. Fez a refeição à luz de velas em um clima nada romântico já que nem dava pra ver direito o que tinha no prato nem tinha uma boa companhia por perto. Solucionado o problema da fome era hora de descobrir se precisaria usar novamente o fogão. No impasse entre tomar um banho gelado de chuveiro no escuro ou utilizar um balde com água quente para se banhar no escuro, ela preferiu a segunda opção. Aqueceu a água, tomou banho, sentiu frio, foi dormir. O livro de cabeceira ficou intocado coitado.            

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Donde vive la belleza


Por la mañana, la chica se despierta, pasa por el espejo y, como de costumbre, no hay como decir que no es fea. Por lo menos, es eso que pensó por toda la vida. Y, al mismo tiempo lo que mucha gente quiso que ella pensase. Sacó de la maleta una ropa nueva para intentar tener una apariencia mejor. En el viaje su principal preocupación no era ser la mujer más guapa del mundo, pero conocer la ciudad y sacar fotos buenas. Sin embargo, creo que a ella le gustaría ser admirada por las personas y tener algo de bello en sí misma para atraer la atención y dejar de ser sólo una pared. En cuanto se vestía, era imposible se olvidar de su adolescencia cuando las muchachas mas lindas que ella caminaban por la escuela haciendo todos miraren con encantamiento. Sería un sueño estar entre ellas, ser una de ellas al menos por un día. Pena que la chica no se daba cuenta de que era muy guapa, no apenas en la apariencia. Después del desayuno, salió por las calles para conocer aquel sitio tan hermoso.

Sin lluvia o un sol muy fuerte, sentía el viento y la iluminación típica de los días de invierno. No hay mejor situación para hacer su trabajo. Los colores se quedan más vivos y vibrantes. Caminó sin grandes planos y fue llevada por el destino a un parque muy grande. Después de unos instantes se quedó sentada en la grama cerca de muchos árboles y entonces admiró todo lo que se podía ver en su alrededor. Muchos niños descalzos indo de un lado a otro con hojas y flores en las manos para hacer sus travesuras. Las madres charlaban sobre los problemas da vida, sus amores, la vida de los demás y otras cosas. Un hombre de unos treinta años pasaba todo el tiempo haciendo la misma actividad: lanzaba una pelota al aire y prontamente la sacaba del suelo y empezaba todo de nuevo. La chica intentó pensar porque aquel hombre hacía una cosa tan sencilla y repetidamente, pero su instinto solo le ordenaba que sacase fotos. A ella le gustaría sólo registrar cuan hermoso era toda la simplicidad de la vida en el parque. Era una muchacha que sabia reconocer las cosas bellas. Bastaba comprender la belleza que se encontraba en ella. Más un trabajo para el tiempo.  

sexta-feira, 3 de junho de 2011

O telefone tocou novamente...


Lá estava ela trabalhando cansada, cheia de preocupações e com uma cólica daquelas de matar. E pra animar ainda mais a festa, tinha fome e estava deprimida como em toda TPM. Em meio ao falatório dos colegas, gente passando de um lado para o outro e problemas chegando de mãos dadas e aos montes o telefone toca. Ela vai, na medida do possível, correndo para atender. Esperava ansiosamente por uma ligação que não resolveria as dores físicas, mas acalmaria o ambiente no trabalho e mataria, por envenenamento, pelo menos uma preocupação.  Melhor do que nada, né?! Entre o alô e a devolução do telefone para o gancho foram poucos segundos. Irremediavelmente tinha dado errado. Tanto esforço, tantas horas de dedicação, inclusive no almoço e fazendo hora extra, se perderam por causa de uma ligação tão rápida. Tentou buscar uma última alternativa com a única pessoa que talvez pudesse ajudar. E a resposta foi um singelo movimento de ombros acompanhado da frase: “Deixa pra lá.” A menina escutou isso apenas uma vez, mas aquelas palavras ficaram se repetindo de forma incansável na cabeça dela. Pensou em palavrões, se imaginou quebrando computadores, lançando folhas e mais folhas de papel pelo ar e gritando para deixar todo mundo chocado. Afinal, aquelas seriam reações incompatíveis para aquela menininha sempre tranqüila. Resistiu a esses desejos imediatos e apenas respondeu: “Tem razão, deixa pra lá.”. 

Pegou a bolsa, o casaco e saiu de lá sem dizer uma palavra nem se importar com o fato de ainda faltar um bocado pra terminar o expediente. Não sabia aonde ir e nem se importou com isso. Foi andando e pegou um ônibus no qual nunca havia entrado e deu sinal para descer quando sentiu vontade. Acabou chegando dentro de um shopping e sentando para comer uma grande fatia de torta que, é óbvio, tinha de ser de chocolate. O poder terapêutico daquela iguaria foi espantando a tristeza e um pouco da dor. Para recuperar completamente o bem estar, a bota vista em uma vitrine fez a sua parte. Sem se importar com o preço, a menina comprou aquele lindo objeto utilizando o bom e velho argumento: ‘Hoje eu mereço um presente!”. Com a sacola nas mãos e um sorriso enorme no rosto saiu caminhando e decidiu voltar pra casa. Teria que voltar ao trabalho no dia seguinte e encarar os problemas velhos e novos. Mas o fato nem passou pela cabeça dela. Estava feliz demais para deixar qualquer preocupação aparecer.                   

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Walkman amarelo


Ela escutou um barulho e resolveu ver o que era. A curiosidade nem sempre leva a situações muito saudáveis, mas mesmo assim a garota não resistiu. Já era de noite, aliás bem tarde, quando ela começou a caminhar pelo corredor escuro. Cada uma das portas por onde passava estava fechada. Provavelmente todo mundo já estava dormindo ou, ao menos, deitado na cama tentando fazer isso. Novamente escutou outro ruído e identificou que ele vinha justamente da ultima porta: o quartinho onde a família guarda algumas coisas antigas. Antigas pra não falar velhas mesmo, porque assim parece menos ofensivo já que se tratam de objetos que algum dia tiveram lá alguma importância. Pra acabar logo com o mistério, tentou ignorar a possibilidade de abrir a porta e ser perseguida por ratos, baratas, lagartixas, escorpiões, formigas, morcegos, gatos e o temido king Kong. (É que quando a menina era apenas uma criança tinha pânico do gorila astro das telonas e jurava que ele vivia atrás daquela porta.) Então respirou fundo e foi logo entrando.

A primeira surpresa foi encontrar um quartinho razoavelmente organizado. Claro que tinha poeira e coisas empilhadas pelos cantos, mas ao abrir a porta nada havia caído em cima dela e o ataque de algum animal ficou apenas na imaginação. Os ruídos que ela escutou foram provocados por duas caixas que caíram abertas de uma prateleira. No chão, foram parar objetos que a menina gostava muito, mas tinham ido fazer uma breve viagem no mundo do esquecimento. Sem se importar em sujar o pijama, ficou lá esponjada no chão tratando logo de pegar o walkman amarelo ganhado, no natal de mil novecentos e não interessa, quando ela tinha 12 anos. Tirou um pouco da poeira com as mãos e ficou lembrando de quando esteve com ele pela primeira vez. Na época, ela fingia que dormia enquanto estava embaixo do cobertor escutando músicas que a garota nem gosta tanto atualmente, mas lembra até hoje de cada uma delas. Lá no cantinho entre as prateleiras, apanhou uma caixinha de música que ainda funcionava tocando aquele sonzinho irritante. A menina se encantou ao ver lá dentro um par de brincos que pensou ter perdido um dia. E como chorou na época em que achou que ficaria sem eles para sempre. A noite foi se alongando e as lembranças foram envolvendo o sono e levando embora. Amanheceu o dia e a menina continuava ali sentindo que o passado também poderia ser visto de forma leve e suave.