quinta-feira, 2 de junho de 2011

Walkman amarelo


Ela escutou um barulho e resolveu ver o que era. A curiosidade nem sempre leva a situações muito saudáveis, mas mesmo assim a garota não resistiu. Já era de noite, aliás bem tarde, quando ela começou a caminhar pelo corredor escuro. Cada uma das portas por onde passava estava fechada. Provavelmente todo mundo já estava dormindo ou, ao menos, deitado na cama tentando fazer isso. Novamente escutou outro ruído e identificou que ele vinha justamente da ultima porta: o quartinho onde a família guarda algumas coisas antigas. Antigas pra não falar velhas mesmo, porque assim parece menos ofensivo já que se tratam de objetos que algum dia tiveram lá alguma importância. Pra acabar logo com o mistério, tentou ignorar a possibilidade de abrir a porta e ser perseguida por ratos, baratas, lagartixas, escorpiões, formigas, morcegos, gatos e o temido king Kong. (É que quando a menina era apenas uma criança tinha pânico do gorila astro das telonas e jurava que ele vivia atrás daquela porta.) Então respirou fundo e foi logo entrando.

A primeira surpresa foi encontrar um quartinho razoavelmente organizado. Claro que tinha poeira e coisas empilhadas pelos cantos, mas ao abrir a porta nada havia caído em cima dela e o ataque de algum animal ficou apenas na imaginação. Os ruídos que ela escutou foram provocados por duas caixas que caíram abertas de uma prateleira. No chão, foram parar objetos que a menina gostava muito, mas tinham ido fazer uma breve viagem no mundo do esquecimento. Sem se importar em sujar o pijama, ficou lá esponjada no chão tratando logo de pegar o walkman amarelo ganhado, no natal de mil novecentos e não interessa, quando ela tinha 12 anos. Tirou um pouco da poeira com as mãos e ficou lembrando de quando esteve com ele pela primeira vez. Na época, ela fingia que dormia enquanto estava embaixo do cobertor escutando músicas que a garota nem gosta tanto atualmente, mas lembra até hoje de cada uma delas. Lá no cantinho entre as prateleiras, apanhou uma caixinha de música que ainda funcionava tocando aquele sonzinho irritante. A menina se encantou ao ver lá dentro um par de brincos que pensou ter perdido um dia. E como chorou na época em que achou que ficaria sem eles para sempre. A noite foi se alongando e as lembranças foram envolvendo o sono e levando embora. Amanheceu o dia e a menina continuava ali sentindo que o passado também poderia ser visto de forma leve e suave. 

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