domingo, 5 de agosto de 2012

Em segundo plano na vida



A menina saiu de casa para cuidar da própria vida. Não, ela não estava se mudando para viver como adulta longe da família. Fazia isso perto dos pais mesmo e não via nenhum problema nisso. O que ela tinha decidido era resolver pequenas pendências que sempre ficavam para trás porque a garota pensava: “Isso aqui não vai atrapalhar a vida de ninguém, então deixa para depois ou para nunca mais”. Mas ela estava enganada ao não tratar certas coisas tão pequenas como prioridades. Afinal, adiar uma visita ao médico, não renovar um documento já com a validade vencida ou deixar as roupas sujas se acumulando no cesto mostravam o descaso que mantinha com alguém tão importante: ela mesma.

A ânsia em deixar os outros sempre satisfeitos, fazer favores e oferecer ajuda para ser aceita, só trazia uma angustia que não passava. Era impossível garantir que todos estariam bem, o que inevitavelmente aparecia para ela como sinônimo de fracasso. Além disso, revelava como a menina se colocava em segundo plano na vida. Talvez por isso aquela saída para tirar o passaporte, fazer exames e ir ao banco carregava um significado especial que a bendita burocracia e a imensa fila não conseguiam apagar. A cada pendência resolvida ela se sentia como reservando um momento exclusivo para si mesma. E isso acabou gerando um efeito cascata. Apareceram mais e mais coisas para resolver e quando não surgiam ela inventava. Era bom demais cuidar de alguém que merecia tanto.

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