Depois de crescida, ela resolveu ir ao circo. Um passeio
desses que toda criança fez ao menos uma vez na vida. Toda criança, menos
aquela garota. Os anos se passaram e ela ficou acostumada a ouvir falar que no
circo tinha elefante, leão, gente cuspindo fogo e engolindo espada. Viu pela
televisão como eram os palhaços e, para ser bem honesta, nunca entendeu porque
as pessoas riam deles. Sapatos enormes, cabelos bagunçados, roupas coloridas,
cara pintada e nariz vermelho. O que que isso tem de engraçado? A garotinha
virou uma jovem e a duvida persistiu. Passou a ter pena daqueles que precisavam
se vestir de palhaço para ganhar a vida enquanto as pessoas retribuíam com
risadas constrangidas, afinal, era preciso achar graça. Sentia desprezo dos
tantos palhaços que recebiam esse título sem precisarem de fantasia, apenas
cruzando a vida das pessoas sentindo o prazer de fazer pequenos estragos
enquanto os outros sofriam porque era o que se poderia fazer.
Talvez o único encanto circense capaz de despertar a atenção
da menina fosse a leveza dos artistas com poderes de mover o corpo para onde quisessem
e sem o menor problema. Se para alguns pode parecer nojento colocar o calcanhar
na nuca, para ela isso é mais mágico do que tirar coelho de cartola. É a
possibilidade de ter controle sobre si mesmo no sentido mais amplo. E como
seria belo caber dentro de uma mala quando a maior vontade na vida é se
refugiar dos problemas e se sentir protegida. Quase tão bom quanto isso seria
disfarçar uma queda ou um tropeço dando cambalhotas sem morrer de dor na coluna
depois. A menina gostaria de fazer tudo isso e até tenta, mas antes é preciso
ganhar elasticidade. Coisa que ela só vai conquistar quando aprender a ser flexível
consigo mesma. As duas coisas andam lado a lado. Vai ver é por isso que tem tão
pouca gente capaz de colocar o calcanhar na nuca quantas vezes for preciso e
sem cara de sofrimento. Tem coisa que é difícil demais...
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