domingo, 24 de julho de 2011

Mais que um secador


De calça de moleton velha e com a barra rasgada, cabelo preso sem a menor preocupação em deter algum fio que resolveu escapulir. E com certeza muitos estavam fora do lugar. As unhas tinham vagas lembranças do que seria um esmalte. Mas mesmo assim a menina resolveu ficar bonita. Queria e precisava disso. Por um bom tempo o desejo de cuidar da aparência estava sendo freado pela misteriosa preguiça que ela desconhecia de onde vinha. Preguiça essa que não tentava dar palpite quando a garota fazia qualquer outra coisa, desde lavar o carro até passar roupas. Enfim, chegava a hora de enfrentar o desafio. Procurou no armário a roupa que achava mais legal. Não era nova, mas na verdade nem precisava ser. Bastava deixar a menina com a aparência mais alegre, de quem gastou algum tempo para escolher aquela roupa e não uma outra qualquer. O resto do trabalho ficaria a cargo do salão. Não o trabalho todo, mas boa parte dele sim. 

Enquanto fazia as unhas, tentava ficar quieta. Apenas tentava. Era impossível não olhar atentamente para a prateleira vendo vidros de esmalte que iam do rosa ao preto passando pelas cores ousadas que as moças usam hoje em dia: amarelo, verde e azul. A menina seria obrigada a decidir entre tantas opções. E foi conservadora escolhendo o vermelho que sempre usava nos tempos em que se arrumava sem grandes dificuldades. Prestou atenção também na conversa da manicure que falava mal de outra cliente (Sim, muitas delas fazem isso quando você dá as costas e sai do salão), no papo da cabeleireira que desviava da fumaça do secador falando da novela das seis. Também teve seus momentos de deixar a atenção se perder e apenas pensar no porque de estar se arrumando. E será que precisava de um motivo? Há não muito tempo atrás essa pergunta nem seria feita. O fato é que independente de pensamentos, conversas, fumaças e fofocas algo de bom acontecia quando as cutículas saiam, as unhas recebiam pinceladas e cada pedacinho do cabelo ficava liso. Crescia uma ansiedade boa de ir logo ao espelho pra ver o resultado. E nem importava se o que ela encontrasse no reflexo parecesse mais especial do que os outros iriam ver. A alegria em se cuidar estava de volta. Levantou da cadeira e seguiu para casa com passos lentos e leves, a cabeça se movendo devagar para convidar o vento a tocar os cabelos. E um sorriso bobo.           

2 comentários:

  1. belo texto! muito lindo, parabéns! acho que vou virar sua fã

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  2. Fico muito feliz quando você gosta dos textos. Falando nisso, tô acompanhando o seu blog e os textos tão cada vez mais bacanas. Parabéns!

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